Após os ataques dos Estados Unidos e dos seus aliados contra as posições dos Houthis há o risco de uma nova escalada
Tomasz Konicz, 31.01.2024
Em 12 de janeiro foi aberta uma nova frente no Médio Oriente: Os EUA e o Reino Unido atacaram posições da milícia xiita Huthi, alinhada com o Irão, no Iémen, que há semanas tem vindo a perturbar com sucesso uma das rotas marítimas mais importantes do mundo. Além disso, a milícia xiita tem tentado repetidamente atacar Israel com enxames de drones e mísseis. Os EUA e a Grã-Bretanha falaram de ataques „bem sucedidos“ e declararam que „não tolerariam“ mais perturbações na navegação no Mar Vermelho. Os Houthis anunciaram imediatamente uma retaliação e ameaçaram que Washington e Londres iriam pagar um „preço elevado“ pelos ataques.
De facto os aliados iemenitas do Irão atingiram um ponto sensível com os seus ataques a navios mercantes. A rota marítima através do Mar Vermelho e do Canal do Suez, que liga a Europa aos combustíveis fósseis da região do Golfo e à fábrica global no Extremo Oriente, deixou de ser segura após vários ataques dos Houthis. Uma grande parte do volume de comércio está agora a ser desviada em torno do Cabo da Boa Esperança, com grandes custos, o que fez com que o tráfego de mercadorias através do Canal do Suez diminuísse em mais de 50%. O tempo de transporte e os custos de transporte estão a aumentar.
Estas manobras perturbadoras contra as já frágeis rotas comerciais globais constituem um novo momento nos conflitos regionais desencadeados em 7 de outubro pela campanha de assassínio em massa do Hamas no sul de Israel. De facto, os Estados Unidos, Israel e o Irão estão a travar uma guerra informal de baixa intensidade, na qual Teerão deixa os seus aliados agir para evitar um confronto directo. No Irão e na Síria, as milícias xiitas atacam agora regularmente bases americanas com drones ou mísseis, enquanto os EUA bombardeiam esporadicamente bases xiitas. No entanto, o maior potencial de escalada encontra-se no Líbano, onde o Hezbollah se envolve em trocas diárias de golpes com o exército israelita. A milícia xiita libanesa é considerada o adversário mais poderoso nas fronteiras de Israel. Dispõe de um arsenal de armas gigantesco e moderno, de tropas altamente motivadas e muito bem treinadas e de um vasto sistema de túneis e bunkers no sul do Líbano.
Até agora todos os intervenientes têm conseguido evitar uma escalada para um conflito directo, para uma guerra de grandes proporções na região. No entanto, à medida que a guerra se arrasta, isso parece estar a tornar-se cada vez mais difícil – não só no Mar Vermelho, mas sobretudo no norte de Israel e no sul do Líbano. Israel parece estar ainda muito longe do seu legítimo objectivo de guerra de eliminar o Hamas, enquanto os custos humanitários desta campanha estão já a atingir proporções catastróficas. As unidades do exército israelita estão a sofrer pesadas perdas e estão a ter de se retirar de partes da Faixa de Gaza. O Governo de direita israelita, cujas falhas na política de segurança tornaram possível a ofensiva terrorista do Hamas, espera claramente que a guerra se prolongue por muito tempo.
Uma confrontação directa entre Israel, os EUA e o Irão parece, portanto, cada vez mais provável, uma vez que a gestão diplomática da crise, actualmente conduzida nos bastidores por todas as partes, terá de atingir os seus limites. Este conflito regional à beira de uma escalada é, de qualquer modo, apenas um aspecto dos crescentes conflitos causados pela crise entre os Estados do capitalismo tardio. Os EUA esforçam-se por manter a todo o custo, incluindo o militar, a sua posição hegemónica – e a posição do dólar como moeda de reserva mundial – enquanto muitas potências grandes e médias (como a Turquia e o Irão) querem utilizar a erosão progressiva do poder de Washington para as suas próprias ambições geopolíticas. A Rússia, em particular, tem interesse na escalada no Médio Oriente, uma vez que isso privará a Ucrânia dos recursos ocidentais necessários para a sua campanha de defesa.
A tendência global é clara: quanto mais as consequências económicas e ecológicas da crise global do capital afectam os Estados, maior é a sua vontade de compensar as crescentes contradições internas através da expansão externa.
Acaba de sair o meu livro eletrónico „O fascismo no século XXI. Esboços da barbárie iminente“: https://www.konicz.info/2024/01/13/e-book-faschismus-im-21-jahrhundert/
Original “Nach den US-Angriffen auf die Huthis: Mittlerer Osten vor Großkrieg?” em konicz.info, 25.01.2024. Antes publicado em “akweb.de”, 16.01.2024. Tradução de Boaventura Antunes https://www.konicz.info/2024/01/25/nach-den-us-angriffen-auf-die-huthis-mittlerer-osten-vor-grosskrieg/